"Assim cresceu Negrinha — magra, atrofiada, com os olhos eternamente assustados. Órfã aos quatro anos, por ali ficou feito gato sem dono, levada a pontapés"
Considerando o excerto de autoria de Monteiro Lobato é possível afirmar:
Alternativas
Comentário
José Bento Renato Monteiro Lobato nasceu, em 1882, na cidade de Taubaté no Vale do Paraíba paulista. Foi escritor, editor e empresário do ramo de exploração de petróleo. Entre contos e narrativas elaboradas por Monteiro Lobato está Negrinha, conto publicado em livro homônimo, em 1920. Sua obra literária, entretanto, é mais conhecida pelas histórias ambientadas no Sítio do Pica-pau Amarelo. Nele vivem os adultos D. Benta, Tia Nastácia, Tio Barnabé, as crianças Narizinho e Pedrinho e os seres fantásticos Emília, a boneca de pano, Visconde de Sabugosa, o boneco de sabugo de milho, Saci, do folclore brasileiro, Cuca, bruxa com forma de jacaré, entre outros.
Tanto nas histórias do Sítio quanto no conto Negrinha as personagens negras são posicionadas em situações inferiores às brancas, situação que se torna evidente, por exemplo, com os constantes xingamentos de Emília contra Tia Nastácia e o desprezo pelo conhecimento da cozinheira que é ignorado diante de enciclopédias lidas por D. Benta. No caso extremo do conto Negrinha, a criança negra personagem principal não é identificada por D. Inácia, a personagem branca, como humana, mas sim como um objeto que, em determinadas situações, assume posições próximas a de animais e é utilizada como escape para situações de raiva e excitação.
Os maus tratos sofridos pela criança são identificados como resquícios do regime escravocrata que fora abolido em 1888 no dia 13 de maio, referência feita no conto. Nesse contexto, D. Inácia incorporaria o pensamento conservador da virada do século XIX para o XX que relutava em aceitar a libertação dos escravizados, inconformada com uma possível igualdade entre brancos e negros.
A obra de Monteiro Lobato contextualiza-se, assim, dentro de modelos estratificados e preconceituosos que fundamentavam a escravatura. Quando utilizada sem repertório crítico como leitura de referência para crianças e adolescentes, reafirma estruturas que são problemáticas, o que pode ser verificado em um grande número de obras literárias do mesmo período. Ainda, no caso do conto Negrinha, a intensidade das agressões cometidas por D. Inácia em oposição à sua boa imagem frente à sociedade cria o tom de ironia que auxilia na construção da ideia de crítica sobre as relações de superioridade e inferioridade racial.