18ª questão
Leia a matéria publicada no jornal cearense A lucta (Sobral, n. 20, 17 de setembro de 1914, p. 2):
"O sr. presidente da Republica conferenciou no dia 1 do corrente com os ministros da Justiça e da Guerra, sobre a situação dos fanaticos do Paraná e Santa Catarina (...)"
Os fanáticos de Paraná Artigo de Jornal
Com base na leitura da matéria jornalística e em seus conhecimentos sobre movimentos político-religiosos populares na Primeira República, é possível afirmar que:
Alternativas
A. O periódico cearense se refere ao movimento do Contestado, conflito ocorrido numa zona de litígio entre os estados do Paraná e Santa Catarina entre os anos de 1912 e 1916, e cujas principais características podem ser encontradas nas disputas por terras e no perfil messiânico que mobilizou os camponeses da região.
B. A conexão entre o movimento ocorrido no Ceará e na região Sul do país demonstra algo que a moderna historiografia dos movimentos sociais brasileiros tem apontado de maneira cada vez mais consistente, isto é, a existência de uma complexa rede que ligou pessoalmente os líderes Padre Cícero Romão Batista, o “santo monge” José Maria e Antônio Conselheiro no intuito de transformar a República numa monarquia teocrática.
C. A utilização do termo “fanáticos” para designar os elementos camponeses presentes no movimento do Contestado e naquele liderado por Padre Cícero denota que os cidadãos letrados de então consideravam-se portadores de valores civilizados em detrimento dos homens do “sertão”, tomados como bárbaros e movidos por crenças consideradas irracionais.
D. Tanto no movimento de Juazeiro quanto no do Contestado, a religiosidade popular cumpria um papel fundamental nas principais formas de resistência à estrutura de poder vigente.
Comentário
Produzido no Ceará logo após o desfecho da “Sedição de Juazeiro”, o documento fornece indícios sobre a “Guerra do Contestado”, ocorrida entre 1912 e 1916, na região fronteiriça entre os estados do Paraná e de Santa Catarina, de forma inevitavelmente marcada pelos conflitos recém-ocorridos em sua própria região. Embora trate de movimentos a princípio dissociados entre si, a religiosidade popular e a presença dos mesmos representantes do poder central em ambos os movimentos permitem ao jornalista estabelecer conexões entre os dois movimentos.
Uma interpretação mais aprofundada do documento conduz a uma reflexão mais ampla sobre os movimentos de resistência à ordem republicana ocorridos no período, sobretudo aqueles que foram marcados pela religiosidade popular. O poder político durante a Primeira República se assentava, em grande medida, no fenômeno do “coronelismo”, ou seja, numa extensa rede política que ligava potentados locais e regionais ao poder estadual e federal. No entanto, era comum que disputas entre coronéis conduzissem a conflitos generalizados, tanto em função das redes clientelísticas forjadas por esses líderes políticos no nível local e regional quanto pela situação de penúria vivida pela população pobre urbana e rural brasileira.
No entanto, é interessante notar que os conflitos de maior envergadura ocorridos no período tiveram como pano de fundo a religiosidade popular. É difícil imaginar o poder político conquistado por Padre Cícero sem a existência prévia de um catolicismo popular para o qual a salvação, correspondente à superação das difíceis condições de vida no semiárido nordestino, seria anunciada ou produzida por um santo ou profeta. Seria igualmente pouco plausível pensar no desenvolvimento de comunidades autônomas e na resistência obstinada de simples sertanejos ao poder da burocracia federal e do capital internacional, como o ocorrido na região do “Contestado”, sem considerar a fé desses homens e mulheres num mundo extraterreno. Desse modo, é o significado, repleto de aspectos religiosos, atribuído por essas pessoas simples do campo e das cidades ao mundo político que pode ser considerado a “força motriz” essencial a esse conjunto de movimentos de resistência de fundo messiânico ocorridos no alvorecer do século XX.
